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Novos Anjos Parte 7

5383 palavras | 14 |4.87
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O tempo simplesmente não se passava, eu me sentia a beira de um abismo, sempre olhando pra baixo no pavor de cair a qualquer momento, cada segundo a minha mente pensava mil coisas. Eu olhava para os lados, olhava para o professor, para meu caderno e tudo parecia um enorme quadro cheio de imagens borradas, sentia vontade de chorar, de gritar em angústia, de correr até o Arthur e pedir perdão, não, implorar, me arrastar no chão, me humilhar para ele se fosse necessário.

A campainha tocou, fim da primeira aula e troca de professor, eu meio paralisado dei uma olhadinha para o lado onde Arthur se encontrava e só consegui vê-lo de cabeça baixa sobre a sua mesa, eu não conseguia fazer ideia do que ele estaria pensando ou sentindo, juntei todas as minhas forças decidido a levantar meu traseiro medroso da cadeira e ir falar com ele, em vão, o próximo professor o de Geografias entrou na sala. Mas que diabos- pensei quase amaldiçoando – como um professor troca de sala tão rápido? Peguei meu livro de Geografia para tentar ao menos fingir acompanhar a aula, ou pior dizendo “as aulas” pois era dois tempos seguidos daquela disciplina. Ao menos teríamos o intervalo, seria um momento ideal para conversar com ele, depois uma aula de ciências, seguida pela aula de inglês deixado por último um tempo de educação física.

Mas naquele dia eu estava mesmo sem sorte, depois de dois tempos tortuosos de aula onde eu praticamente não acompanhei nada o intervalo tocou mas eu fui impedido de sair pelo professor.

Paulo, venha até a minha mesa por favor- chamou em tom severo-. O que está havendo com você? Não pense que não notei, você passou a aula inteira perdido, olhando para as paredes, vendo o tempo passar e aposto que não fez o exercício que passei no decorrer da aula .

Fiquei vários segundos com cara de palerma sem saber como me justificar, de que jeito explicar o que eu tava sentindo naquele momento, que eu estava apaixonado pelo meu melhor amigo, e não sabia se era mútuo e que eu ainda por cima tinha estragado tudo.

Olhe aqui Paulo- ele me disse num tom bem mais afetuoso- é algum problema na escola? Ou em casa? Podemos ir na direção, ninguém vai te dar bronca, se você estiver com problemas vão ajudar.

Comecei a ficar com os olhos marejados, era muita coisa para um dia só e eu tinha um probleminha muito sério com confrontos, eu não sabia receber bem quando alguém ficava bravo comigo ou levantava a voz, minha reação imediata era me recolher e começar a ter vontade de chorar.

Também se não quiser falar nada neste momento tudo bem- passou a mão em minha cabeça carinhosamente – olha Paulo, eu já tive a idade de todos vocês e embora fossem tempos diferentes eu sei que nunca foi nem vai ser uma idade fácil. Você está agora no meio do caminho entre ainda ser criança e abraçar as responsabilidades de virar adulto.
Desculpa professor- levantei a cabeça e ele pôde ver a lágrima de arrependimento que escorria no meu rosto. Juro que não atrapalho mais a aula.
Tudo bem, tudo bem, não quero ver você nem ninguém chorando. Só me prometa que se estiver com qualquer problema sério vai pedir ajuda , combinado.
Combinado, falei enxugando a lágrima.
Então bate aqui- ele estendeu a mão – dei uma batidinha já mais tranquilo e com um leve sorriso. Agora vamos logo senão ninguém come seu lanche hoje, deu uma piscadinha.
Obrigado prô, eu tenho que procurar o Arthur agora, preciso falar algo urgente.
Acho que não vai precisar sair então, não é ele bem ali no fundo da sala? Bem, vou indo, até a próxima, tchau.

Que incrível, era mesmo o Arthur, ele nem havia saído da sala, estava de cabeça baixa em sua mesa, com os braços cobrindo totalmente seu rosto deixando-o como se fechado em um casulo. Passaram alguns segundos antes que eu criasse coragem, mas levantei e andei lentamente em sua direção.

Arthur…oi… você tá bem? Perguntei sem obter resposta alguma. Continuei… você não falou comigo, tá todo quieto aí no seu canto…

Eu não percebia um movimento sequer dele, cheguei até a imaginar que estivesse dormindo, resolvi insistir e toquei no seu ombro.

Fala alguma coisa Arthur, por favor… a gente acabou o dia tão legal ontem, por que você tá assim? Nada de resposta ainda, comecei a me sentir incomodado, tentei argumentar uma última vez tentando descobrir a verdade.
Você tá…você tá bravo comigo? Foi algo que eu fiz? Ele finalmente falou alguma coisa, mas tão baixo e tão abafado que eu não entendi- o que? Não entendi nada.
Vai embora- repetiu agora de forma que eu entendi claramente.
O quê? Mas o que houve? Me diz por favor.
Sai daqui, me deixa sozinho. Não quero ninguém por perto de mim.
Desculpa Arthur- respondi choroso- eu não devia…
Tá pedindo desculpas porque? Eu só quero ficar sozinho sacou? Me deixa em paz, porque vc não volta pra sua casinha perfeita com sua vidinha de filhinho de mamãe que tem tudo?

Aquilo doeu muito, ele me chamar daquilo era uma punhalada dolorosa, mas eu estava vendo na minha frente o quanto ele parecia sofrer por algo desconhecido que eu usei todas as minhas forças para não rebater, apenas baixei minha cabeça e em silêncio retornei para minha cadeira.

Nem preciso dizer que o restante das aulas foi uma porcaria, eu estava totalmente vazio por dentro, de um lado eu imaginava que ele havia usado aquelas palavras para me fazer sair logo de perto dele, mas eu também não conseguia deixar de pensar se não havia realmente sinceridade naquilo tudo. Será que ele realmente achava que eu era só um moleque mimado que não dava valor pras coisas e o pior de tudo, eu não conseguia pensar em nenhum argumento se autodefesa. Eu era mesmo mimado.

Ao final da interminável aula de ciências arrumamos nossas coisas, seria aula de educação física e assim que o professor chegasse nos levaria para o ginásio o que de fato ocorreu depois de ele rapidamente fazer a chamada nos pediu para organizar em fila e sair em direção a quadra de esportes. Esperei a maioria dos alunos saírem, eu não estava com ânimo algum para querer chegar logo, me levantei devagar e caminhei para o corredor, com o canto do olho notei que o Arthur conversava algo com o professor.

Chegando no ginásio apenas tirei a calça do uniforme normal. Em dias de educação física eu geralmente ia com os shorts por baixo da calça e a camiseta eu levava na mochila e trocava ali mesmo. Deixei minha mochila num canto da arquibancada que rodeava a quadra e entrei.

Comecei a alongar como o professor havia ensinado na aulas passadas enquanto aguardava a aula começar, pelas bolas espalhadas na quadra percebi logo que íamos treinar basquete, ah como eu odiava ter que ficar quicando aquela bola pesada e dura enquanto os outros jogadores saiam no tapa para pegá-la, não era um esporte pra alguém do meu tamanho. Logo o professor chegou, notei que veio junto com o Arthur que ao invés de entrar na quadra sentou num canto baixo da arquibancada e ficou apenas de observador.

Aquilo tava ficando mais estranho a cada minuto, porque o professor dispensou ele da aula? Será que estava doente ou se sentindo mal? Isso justificaria uma parte do seu comportamento mas não aquela parte que me dizia respeito, porque ele foi tão grosso comigo e pediu para que me afastasse?

Resolvi me concentrar na aula naquele momento mas pensando em no final tentar mais uma vez tentar descobrir o que estava havendo. Nas poucas vezes que olhava para onde o Arthur estava via ele sempre de cabeça baixa, ele parecia mal. Restando 5 minutos para terminar pedi ao professor para beber água, sabia que por estar no finzinho ele me mandaria tomar água e arrumar minhas coisas, dito e feito.

Muito bem- disse o professor – faltam poucos minutos para o fim da aula, beba sua água e já pode ir guardando suas coisas para ir embora e tenha um bom fim de semana, cumprimentou.

Corri até os bebedouros e fingi tomar água bem rápido mas logo me voltei para as arquibancadas, lá estava o Arthur se levantando notei que meio com algumas dificuldades. Fui andando até ele com toda coragem que consegui acumular.

Arthur, vem cá – olhei fixamente enquanto me aproximava, e ele ficava imóvel. Fala comigo, vai?
O que você quer? Perguntou secamente.
O que eu quero? Poxa, não é óbvio não? Quero meu amigo de volta, porque o Arthur que eu deixei ontem em casa não é esse mesmo que eu tô vendo aqui hoje.

Ele nada respondeu, apenas se sentou vagarosamente e baixou a cabeça.

Me desculpa Arthur, foi tudo culpa minha, eu não devia…
Para, para, cala a boca droga. – ele gritou se pondo a chorar. Porque você tá fazendo isso? Porque me pede desculpas? Eu é que não presto aqui… fica longe de mim… você só vai arrumar problemas se ficar perto de mim.

Naquele momento ficou claro que o problema não tinha sido o beijo roubado, era alguma outra coisa, algo bem pior. Comecei a pensar…se não foi nada no período em que ficou na minha casa…então só poderia ser alguma coisa que aconteceu na casa dele.

Vamos Arthur, somos amigos, por favor me deixa de ajudar, me deixa entender o que está acontecendo.
Não posso cara, não posso, só vai arrumar problemas, problemas gigantescos, não quero te envolver. Não insiste por favor… eu deixo de ser seu amigo se for o caso.
Não…não – repeti- não quero isso, para de falar que nem adulto, somos crianças ainda, ou um pouquinho mais do que isso. Não vou te deixar ter que resolver isso sozinho. Tentei consolá-lo me aproximando mais e colocando as mãos ao redor de seus ombros num abraço.
Não Paulo, não faz isso por favor, você não pode ver… murmurou- entre soluços.
Ver o que? Indaguei- eu sabia, você está escondendo algo não é? Me conta.
Não posso, não tenho forças, sou um covarde me escondendo numa máscara de bobo alegre.
Para com isso- eu retruquei enquanto tentava imaginar qual era o problema. Me afastei alguns centímetros como ele pediu mas continuei segurando suas mãos enquanto ele chorava novamente de cabeça baixa num lamento que parecia não ter fim.

Nesse momento o acaso acabou revelando toda a verdade, uma forte rajada de vento passou por nós e levantou a camisa do meu pobre amigo, eu pude ver suas costas, não consegui esconder meu espanto seguido de uma tristeza angustiante, mordi meus lábios, senti a boca seca, um gosto amargo de infelicidade que pairava naquele ambiente, vi várias marcas avermelhadas e roxas em suas costas, algumas bem grandes, parecia ser de cinto ou algo do tipo, pensei. Ao redor delas uma grande mancha roxa enegrecida se destacava de uma ponta a outra, entendi o motivo de ele quase não se mexer durante as aulas.

Arthur, apertei mais suas mãos – ele… ele… eu não conseguia completar a frase… ele…bateu em você? Foi isso?

Pronto, o segredo estava descoberto, ele me encarou com o olhar mais profundo e triste que já vi na vida, senti uma coisa ruim pairar no ambiente, quase tão ruim quanto no dia que minha mãe morreu. Ele estava com um misto de tristeza e desolação que agora ganhava uma grande quantidade de vergonha.

Pronto, agora você já sabe- ele finalmente respondeu. Agora me deixa por favor, me deixa, não quero que os meus problemas afetem você.
Não vou, não vou nunca sair de perto de você, não vou te abandonar. Falei olhando firmemente pra ele.
Faz o que eu peço por favor, se você é mesmo meu amigo faz o que eu peço, me deixa, eu não valho tudo isso.
Droga Arthur eu já falei- para de falar que nem adulto. Para de falar como se não tivesse esperança, vamos lutar nessa, juntos. Você acha que um amigo de verdade só fica próximo do outro nas horas felizes? Não ,quem ama de verdade está do lado do outros nos momentos bons e nos ruins, eu aprendi isso com os meus tios, eles que me tiraram da rua, me deram tudo, me fizeram ser feliz se novo.
Eu não tenho mais forças pra discutir com você, tá doendo muito- ele disse agora com a respiração pesada.
Vai, levanta e se apoia em mim eu vi que você tava andando com dificuldade. O que você disse pro professor?
Ah. Falei que tava com dor de cabeça, e disse que tinha batido o pé na escada de entrada. Acho que pela minha cara horrível ele acreditou na hora- deu um sorrisinho. Olha, ainda consigo rir um pouquinho.
Bobão – ri de volta numa tentativa de levantar o moral ao menos um pouquinho.

Coloquei as duas mochilas no ombro direito enquanto Arthur se apoiava no meu ombro esquerdo, praticamente nos arrastamos pelos corredores já vazios da escola, incrível como nessas horas ninguém aparece para ajudar.

Andamos até a porta de saída e nem o porteiro estava lá, parece que todo mundo dava muito valor ao seu sagrado horário de almoço, o local poderia facilmente ser comparado com um lugar abandonado, não se via uma viva alma. Pensei em ir até a diretoria mas Arthur se opôs.

Por favor Paulo não, pelo menos não agora- disse- eu sei o que vai acontecer se a escola souber disso.
Mas você precisa de cuidados – argumentei notando que nossa caminhada fez ele piorar significativamente. Agora ele estava pálido e com a respiração cada vez mais pesada. Vem comigo então. Droga pela hora perdemos as vans de novo.

Sentamos num dos bancos a frente da escola enquanto eu pensava no que fazer. Ligar pro Luca como fiz ontem? Hoje era uma emergência real mas logo lembrei que era sexta feira, dia em que ele tem cursinho de fim de semana. Só restava tentar ligar pra minha tia, pensei, deixei Arthur sentado no banco enquanto eu buscava nervosamente o número de minha tia na agenda do celular, ele agora fazia uma carinha de dor que partia meu coração em um bilhão de cacos. Finalmente o celular começou a chamar e ela atendeu.

Alô, tia Júlia falei nervosamente – A Sra está ocupada?
Paulo meu Deus, onde você está? Perguntou com preocupação – eu estava prestes a ligar para você, o Sr da Van me ligou dizendo que você perdeu a condução ontem e hoje de novo, o que está havendo?

Nesse momento me virei para o Arthur, que estava de cabeça baixa pela milésima vez e parecendo piorar cada vez mais, não aguentei e me pus a chorar ao telefone.

Tia,..tia me perdoa- choraminguei- é o Arthur tia, ele tá passando mal, ajuda a gente por favor, preciso muito de você.
Meu Anjo- ela se alarmou do outro lado da linha, o que aconteceu? Não, não diga mais nada, me espere aí na frente da escola, estou indo imediatamente, vou chamar seu tio.

Voltei ao lado de Arthur no banco enxugando as lágrimas, não sabia mais o que dizer, só restava lhe confortar em silêncio enquanto aguardava, uma espera dolorida, demorada, cada segundo parecia durar um ano. Finalmente vi os dois ao longe chegando em passos apressados.

Meu Anjo- chegou primeiro minha tia e me abraçou. O que houve afinal de contas?
É o Arthur tia, ele tá passando mal- falei voltando a chorar nervoso.
Fique calmo, agora vai ficar tudo bem, seu tio vai examiná-la e se for o caso vamos pro pronto socorro.
O que está sentindo Arthur? Perguntou meu tio. Sem obter resposta. Nesse momento ele apenas olhou em minha direção.
Fala Arthur, é o único jeito agora, a gente vai te ajudar eu prometo .
Não tem mais jeito né? Tudo bem, tira minha camisa, sozinho eu não consigo. Levantei sua blusa e pude ver o rosto preocupado dos meus tios.
Arthur, meu querido…o que aconteceu com você? Se alarmou minha tia. Alguém agrediu você? O que foi isso?
Querida, fique calma por favor- disse meu tio- deixe eu examinar o garoto . E assim o fez por alguns minutos enquanto observamos em silêncio. Meu tio finalmente falou.
Olha Arthur, sei que você deve ter muitos motivos para ficar calado, mas preciso mesmo que você me diga o que causou tudo isso.
Foi meu pai… susurrou- me bateu de cinto ontem a noite, desabou novamente a chorar sendo apenas interrompido por uma forte tosse.
Fique calmo, você agora não deve se agitar, como vocês vieram até aqui? Você não devia ter se movido tanto.
A gente andou do ginásio até aqui tio, eu ajudei ele a caminhar, viemos bem devagar, mas isso parece que fez ele ficar pior.
Tudo bem, o que está feito está feito. Querida, virou-se para minha tia, vamos para o hospital imediatamente.
Meu Deus, é grave demais? Perguntou com a voz embargada.
Talvez – respondeu- ele tem algumas contusões bem severas nas costas e… bem… eu suspeito que esteja com uma ou duas costelas quebradas.

Aquilo foi um baque enorme, que animal faz isso com o seu próprio filho? Eu pensava, ele era tão pequeno, magro e frágil. Agora eu só pensava em pegá- lo em meus braços e cuidar dele, fazer carinho, lhe dar força, não deixar que ele ficasse só.

No caminho do hospital Arthur contou tudo o que aconteceu na noite anterior. Seu pai chegou embriagado em casa e se irritou quando soube que o Arthur passou a tarde em nossa casa, ele percebeu pelas minhas roupas que ele usava.

Ele ficou com muita raiva, disse que não era pra eu ficar me envolvendo com os alunos ricos da escola, que eu devia saber o meu lugar e não ficar pedindo esmolas como um mendigo.

Meu coração tava quase saindo pela boca ouvindo tudo aquilo, eu apenas conseguia olhar triste para o Arthur enquanto segurava suas mãos. Do lado oposto minha tia que havia ido no banco de trás também para ficar perto do Arthur passava as mãos em seus finos cabelos pretos e vez ou outra lhe enxugava uma lágrima.

Arthur, vamos fazer de tudo para te ajudar- eu realmente sinto muito mas depois daqui certas providências terão que ser tomadas.
Vão prender meu pai? Tio, por favor não faz isso, ele falava entre um soluço e outro- era disso que eu tinha medo.
Pelo visto não adianta esconder coisas de você, já vi que é um menino com maturidade acima de sua idade, mas eu prometo que vou tentar fazer da melhor forma possível, se ele cooperar e aceitar se tratar e principalmente não agredir mais você ele certamente não precisa ser preso.
Eu nunca vou conseguir retribuir a bondade de vocês todos tio. Obrigado.
Não fale mais nisso, estamos chegando, não se esforce mais falando, é obrigação de todas as pessoas ajudar quem precisa, espero que seja uma lição para a sua vida e a sua também viu Paulo?
Sim Senhor- respondi baixo enquanto apoiava a cabeça do Arthur no ombro.

Finalmente chegamos, era o hospital onde o meu tio trabalhava , logo chegou uma cadeira de rodas onde colocaram Arthur para levá-lo até o raio x, eu sabia que não poderia entrar, mas depois de suplicar para minha tia ela permitiu que eu ficasse na sala de espera caso contrário ela queria me mandar de volta para casa.

Tudo bem meu Anjo, por enquanto vou tentar entrar em contato com a família do Arthur, já avisei os meninos que você está comigo, mas depois vamos sentar e ter uma conversa muito séria.
Obrigado tia- lhe abracei- ele é meu melhor amigo não posso abandonar ele.
Eu sei meu Anjo, e estou orgulhosa de você pela sua bondade , carinho e disposição para ajudar. Nós todos vamos ajudar, mas você também precisa entender que há um limite onde podemos interferir na família dele.

Não sei dizer quanto tempo se passou, uma hora duas? Perdi a noção, estava afundado em pensamentos imaginando o que aconteceria daqui pra frente, em um determinado tempo vi minha tia no fundo do corredor recebendo duas mulheres, uma senhora idosa baixa e de cabelos brancos longos e outra mais alta, não conseguia ver seu rosto mas pelos cabelos tão negros deduzi que era a mãe do Arthur.

Pensei em ir até elas mas não consegui imaginar o que diria, provavelmente levaria bronca de minha tia dizendo que estavam tendo conversa de gente grande. Eu me sentia triste por não saber onde estava meu amigo, o que seria de nós agora? Durante nossa discussão no ginásio eu meio que declarei que o amava, será que ele ia lembrar disso? Será que ele ia apenas achar que foi uma coisa de momento, ou mesmo um amor apenas de amigo?

Olhei meu celular…quase 17:00, lembrei que não comia nada desde o café da manhã, nem o lanche eu comi na escola, peguei minha mochila e abri buscando meu lanche que a tia Júlia todos os dias colocava. Um sanduíche de queijo, alguns pedaços de frutas que já estavam mais mortos do que vivos e uns biscoitos de maçã com canela, peguei um e dei uma mordida, engoli com dificuldade, minha garganta parecia seca, como se arranhada, um gosto amargo pairava no sabor do biscoito, dei uma mordida no sanduíche e o mesmo sabor amargo se repetiu, será que voltarei a sentir um sabor agradável na vida? Pensei. Estou sendo egoísta de ficar lamentando minhas tristezas enquanto o Arthur está numa situação bem pior?

Guardei novamente o que restou, eu não ia conseguir comer mais do que aquilo mesmo, mais alguns minutos se passaram e minha tia retornou.

O que aconteceu? Perguntei – onde ele está?
Fique calmo meu Anjo – ela respondeu – vou tentar resumir tudo o que ocorreu. Aquelas senhoras que vieram mais cedo são a vó e a mãe do Arthur, elas estão muito abaladas. Na hora que tudo ocorreu elas não estavam em casa e não tinham noção de que o pai do Arthur teria lhe batido com tanta violência. Após o ocorrido ele se trancou no quarto e como a mãe dele chegou tarde do trabalho deduziu que ele apenas já estava dormindo.
E porque ele foi pra escola daquele jeito? Indaguei
Parece que de manhã ele tentou esconder o que havia ocorrido, pelo seu relato ficou com medo de ficar em casa já que o pai permaneceria pela manhã no lugar. Neste momento ele já foi medicado, recebeu remédio para dor, felizmente não houve fratura total nas costelas, apenas algumas rachaduras, agora ele deve ficar de repouso.

Logo se aproximaram as duas mulheres e a mãe do Arthur veio e estendeu os braços me abraçando.

Eu nem sei o que dizer- falou lamuriosamente- muito obrigada por tudo o que fez pelo meu menino.
Gosto muito dele, é meu amigo.
Preserve sempre seus bons amigos- veio a vó dele me estendendo a mão.
Sim senhora- respondi encabulado- o que vai acontecer agora tia Júlia? Perguntei me voltando para ela.
Tudo bem. Não vou esconder de você essa parte é a mais difícil. Vamos até a delegacia, seu tio está nos aguardando lá. O Pai do Arthur está lá também, vamos todos tentar resolver o assunto.
Ele não é um homem agressivo – disse a mãe de Arthur- o problema é essa maldita bebida, quando ele bebe se transforma em outra pessoa. Se lamentou.
Então vamos- chamou minha tia- no caminho deixarei vc em casa, apontou para mim.
Quero ficar…quero ficar com ele tia. Pedi –
Meu Anjo… você não almoçou, não tomou banho ou descansou eu entendo a sua preocupação, mas ele não vai estar sozinho. Ele está recebendo o melhor atendimento possível, está medicado e sendo monitorado, qualquer coisa tem vários enfermeiros para auxiliar, não vamos demorar mais do que 2 horas.
Quero ficar… repeti agora com lágrimas no rosto, por favor tia… supliquei.
Paulo… por favor… tente entender…

Como eu já devo ter explicado antes quando ela trocava o “meu Anjo” por “Paulo” era fim de jogo. Nunca consegui o que queria quando ela ficava seria desse jeito e me chamava pelo nome. Mas dessa vez não tinha alternativa, precisava dessa vitória. Resolvi apelar para o último recurso.

Deixa eu ficar com ele tia, eu vou ficar bem, só vou ficar com ele, não vou fazer nenhuma besteira, eu juro, juro pela minha mãe. Ela deu um suspiro e seu olhar mudou, pronto, primeira vitória da minha vida.
Tudo bem… você venceu… vá até ali na recepção e peça para lhe mostrarem onde fica o quarto dele. Se não me engano é o quarto 64 no 6° andar. Agora nós vamos sair mas voltamos em 2 horas. Fique com seu celular em mãos tudo bem?
Tia? Chamei uma última vez… Te amo
Também te amo meu Anjo. Me deu um beijo no rosto.

Rapidamente me dirigi até a recepção e ao pegar informações se como chegar ao local me dirigi ao elevador, estava mais tranquilo ou pelo menos voltando ao meu normal. Cheguei até a recepção do 6° andar onde me apontaram o corredor dos quartos, me dirigi até o quarto 64 e abri a porta bem devagar. Ele estava deitado na cama, com o braço direito imobilizado junto com grandes faixas ao redor do seu peito, algum tempo depois meu tio explicaria que imobilizar o braço era o que evitaria movimentos bruscos no tórax.

Em seu braço esquerdo uma bolsa de soro, provavelmente com a medicação, em seu rosto um pequeno respirador nasal. Seu olhar parecia mais sereno, parecia estar mais tranquilo agora.

Arthur, ei Arthur, vc esta acordado?
Estou sim. Vc acha que eu durmo de olhos abertos? Sorriu.
Bom ver que você está bem, já está até contando piadas sem graça.
Ei, claro que todas minhas piadas são engraçadas, seu chato. Sorriu.
Bobão – ri junto. Que bom que você está melhor agora. Tá doendo muito ainda?
Nadinha, só mesmo a furada da agulha aqui, os remédios tão fazendo efeito.
Sim, mas olha, o soro tá quase acabando, vou apertar no botão aqui e chamar a enfermeira.
Chama então, vou aproveitar e pedir para tirar esse negócio do meu nariz ,tá incomodando pra caramba .

Logo após a chamada veio a enfermeira que examinou rapidamente os curativos, trocou a bolsa de soro por uma nova e retirou o respirador de seu nariz.

Vejo que está respirando bem melhor agora. Qualquer dificuldade basta chamar que recolocou o respirador, está bem? Daqui a alguns minutos traremos algo para você se alimentar, lembre de comer devagar. Logo se retirou nós deixando novamente a sós.
Te prepara, eu falei- comida do hospital é horrível.
Eca, eu sei, quando eu era pequeno quebrei o pé jogando bola, passei 3 dias no hospital, mas eu aguento, tô mortinho de fome. E você? Não comeu nada?
Tô bem, não se preocupe, não vou roubar sua janta- fiz graça.

A comida logo chegou. Uma sopa de legumes com um aroma até que bom. Um copo de suco natural e alguns pedaços de frutas com uma gelatina amarela de sobremesa.

Por enquanto coma pequenas porções e comida menos solida- disse a enfermeira – se tiver mais fome avise que traremos um lanche antes de dormir.

Novamente ficamos a sós e o Arthur sentou na cama com minha ajuda mas não tocou na comida.

O que houve? Perguntei. Não vai comer.
Não é isso, quer dizer sim quero comer mas olha aqui apontou pra si mesmo com os dois braços presos. Acho que vou precisar da sua ajuda.
Ah desculpa, nem tinha reparado. Vou te dar comida na boca então bebê – fiz graça.
Hahaha. Tá bom pode rir a vontade seu palhaço. Mas me dá logo. Tô desmaiando de fome aqui.
Olha o aviãozinho – zombei- enquanto levava uma colher de sopa a sua boca. Rimos juntos.
Credo, essa sopa não tem um pingo de sal, parece só água com pedaços de verduras triturado. Fez careta.
Trata de comer tudinho viu bebê? Ri mais ainda. E fui lhe dando várias colheradas.
Afff. Tá bom- reclamou, já comi quase tudo agora me dá essas frutas aí, e a gelatina também, preciso tirar o gosto ruim da boca.
Tá bom bebê toma as frutas – coloquei uma colher em sua boca.
Você vai me encher o saco com esse apelido agora é? Ele reclamou. Tá tudo bem, eu já sei o seu.
Sabe? Qual é? Perguntei
Ouvi sua tia falar um monte de vezes. Me explica, qual é esse negócio de “meu Anjo”?
Haha- ri meio envergonhado. Você notou? É meio óbvio não? Meus cabelos loiros com essas pontinhas enroladas na franja e meus olhos claros. Por isso ela me chama assim desde pequeno.
Ah. Você tem o cabelo e os olhos principalmente muito bonitos.
Ah. Obrigado – respondi com as bochechas avermelhadas. Você também é bonito.
Que mentiroso, ele riu- sou super comum.
Que nada, acho legal esse seu cabelo preto e liso, é igualzinho o da sua mãe.
Ah. Você conheceu ela?
Só falei rápido com ela. Estavam de saída, foram para…. Não completei a frase.
Tudo bem… eu sei pra onde foram…agora tá nas mãos de Deus.
Vou estar ao seu lado, me aproximei coma última colherada de gelatina, errei sua boca e bati a colher em seu queixo derramando sobre seus ombros . Me aproximei mais ainda na tentativa de limpar quando ele me parou e me olhou fixamente com o rosto quase colado ao meu.
Não, tudo bem, olha eu preciso de dizer duas coisas, me perdoa pelas coisas que eu te disse tentando te afastar, você tinha razão, aquele não era eu.
Esquece isso, eu sei que você estava nervoso, não falou por mal, não foi de coração, eu te perdôo sim.

Ficamos a nos olhar novamente por vários segundos, meu Deus como ele era lindo, fiquei hipnotizado pelo seu olhar que não desviava do meu. Até que curioso perguntei. E qual é a segunda coisa que você queria falar?

Muito obrigado por me salvar e por cuidar de mim, ele se aproximou e tocou meus lábios com os seus me beijando.

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14 Comentários

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  • Responder @Jj_marston ID:gp1eri6zj

    conto legal, muito bom

  • Responder paulo cesar fã boy ID:7121w172d1

    por favor cara. faz isso comigo não …estou me remoendo aqui de tanta ansiedade …posta logo o próximo capitulo.

  • Responder Notman ID:bemn9j5xik

    Por favor, continue!

    Gosto de histórias que misturam um pouco da nossa realidade. Violência doméstica, vícios, machismo, preconceitos, etc…
    Estou ansioso pelo novo capitulo.
    Obrigado por nos proporcionar esta preciosidade!

  • Responder Jozeto ID:8eez5vpd9a

    Muito obrigado pelas palavras de apoio e elogio de todos. Peço desculpas pela demora da parte 8, como eu disse antes eu estava viajando (e postei durante a viagem para não deixar vocês esperando). Agora que retornei para casa estou arrumando algumas coisas por aqui mas a parte 8 logo vai estar prontinha.

  • Responder greenbox amigobc ID:dloya5u40

    Meu amigo gostei bastante bastante deste capítulo, você abordou um tema forte.
    E bem atual infelizmente eu estou viajando mais eu estou acompanhado você eu me emocionei com esta parte porque meu filho antes de eu adotar ele sofria bastante com maus tratos. tenho vergonha em falar isso porque aconteceu e sempre vai estar nos lares destruídos pela esta maldita bebida .

  • Responder PAULO CESAR FÃ BOY ID:7121w172d1

    caralho …que final lindo, espero que de tudo certo para o Arthur.

  • Responder Nelson ID:8cio2sam9k

    Que coisa mais linda. Li preocupado mas esse beijo no final foi triunfal . Fiquei até emocionado. Sua escrita prende nossa atenção. Adorando o conto. Obrigado e volta logo por favor.

  • Responder Boy ID:4adfr4iufic

    Você é foda Jozeto

    • Brunno ID:2ql48xt0j

      AAAA continua mano nmrl, to amando, gritei aqui quando eles finalmente se beijaram agora no final

  • Responder ROXO ID:gqbannpv3

    Continua pff

  • Responder Fênix negra ID:1daifftfia

    Nossa que lindo 😍

  • Responder Notman ID:bemn9j5xik

    Muito bom!

  • Responder Danilo ID:3ynzdhgz8rb

    Excelente conto continua pf

  • Responder Poczinha ID:1ejm5aouelwc

    Posta a parte 8 amanhã. Estou amando esse conto